Estado é responsabilizado por troca de bebês em hospital gerido por entidade filantrópica em Ibirama

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Jor. Marcelo Zemke

Caso é de 1973, mas ação foi proposta em 2021, após DNA confirmar troca

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Marcelo Zemke

O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) determinou que o Estado é responsável pela troca de bebês recém-nascidos ocorrida em 1973 em um hospital de Ibirama, administrado por uma entidade filantrópica privada, devido ao fato de o serviço ter sido prestado em um prédio público. A decisão da 2ª Câmara de Direito Público do TJSC, proferida após uma ação proposta em 2021 e que se seguiu à confirmação do erro por meio de exame de DNA realizado em 2020, trouxe à tona um caso dramático que havia sido destacado pelo JVN, ao narrar a busca de duas mulheres ibiramenses por reparação judicial, 47 anos após o incidente.

Conforme destacado, duas mulheres ibiramenses, que buscavam reparação judicial pelo erro que ocorreu no Hospital e Maternidade Miguel Couto, incorporado à Fundação Hospitalar de Santa Catarina, e administrado na época pelas irmãs da congregação “Franciscanas” de São José. O hospital funcionava onde hoje está a Associação Hansahoehe. O Estado de Santa Catarina devolveu o prédio para a comunidade em 1986. Na época, uma das mulheres decidiu colaborar com a reportagem, mas com uma condição: sem nomes. “Sem nomes por favor! Mesmo assim, a grande maioria já sabe de quem se trata, mas minha mãe sofre muito com isso. As mães sofrem mais do que a gente”, estabeleceu.

Ambas frequentavam a casa uma das outras e compartilhavam semelhanças com ambas as famílias. “Na época da escola éramos amiguinhas de classe. Uma frequentava a casa da outra, e o tempo foi passando e essa dúvida sempre existiu”, disse na época. Foi feito o teste de DNA para tirar a dúvida, e o resultado provou que ambas foram trocadas na maternidade. O resultado positivo causou muita dor em ambas as famílias.

Decisão

Conforme a decisão, a responsabilidade civil pela troca de bebês recém-nascidos devido à falta de cuidado de um hospital, apesar de ele ser administrado por uma entidade filantrópica privada, recai sobre o Estado, uma vez que o serviço de saúde foi prestado em um prédio público. Esse foi o entendimento da 2ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) ao julgar recurso do Estado contra sentença que condenou o Poder Executivo catarinense a indenizar duas pessoas trocadas por ocasião do nascimento em uma instituição de saúde do Vale do Itajaí.

Em primeira instância, o Estado foi condenado a pagar R$ 100 mil a cada um dos trocados na maternidade. No recurso de apelação, o ente público postulou pelo reconhecimento de prescrição, pois o caso ocorreu em 1973, enquanto a ação foi proposta em 2021. Para o Estado, a data do resultado do exame de DNA, em 2020, não implica mudança do termo inicial para cálculo da prescrição.

No mérito, sustentou a inexistência do nexo de causalidade e a culpa exclusiva de terceiro, porque a instituição de saúde era gerida à época por entidade filantrópica privada que não integra a administração estadual. Alegou ainda que os autores não comprovaram o dano moral, porque admitiram que o relacionamento com os pais biológicos permaneceu sem mudanças depois do conhecimento do exame pericial. Também houve pedido de redução do valor indenizatório.

De início, o relator da apelação aplicou a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça (STJ), pela qual o termo inicial do prazo prescricional para o ajuizamento de ação de indenização contra ato do Estado ocorre no momento em que constatada a lesão e os seus efeitos. Mesmo que já existisse a desconfiança, a troca dos bebês só foi confirmada com o resultado do exame de DNA, em setembro de 2020.

Quanto à responsabilidade do Estado, o voto transcreve os documentos que instruíram a causa. Em 1972, o hospital passou a ser gerenciado pela Fundação Hospitalar de Santa Catarina e administrado por representantes de uma entidade filantrópica que faziam atendimento à população de forma gratuita. Segundo informações de ex-servidores que trabalhavam na unidade hospitalar em 1973, o vínculo dos profissionais era com a Fundação Hospitalar de Santa Catarina, em regime celetista.

Ainda que a fundação tenha sido extinta em 1992, os direitos e obrigações remanescentes foram incorporados, por decreto estadual, ao patrimônio do Estado. “Logo, como o serviço de saúde foi prestado em hospital público, há legitimidade passiva do Estado de Santa Catarina e, em consequência, sua responsabilidade”, destaca o relator. Na sequência, o voto apresenta decisões da 1ª e da 4ª Câmaras de Direito Público, que seguem o mesmo entendimento.

Por fim, houve provimento parcial do recurso para reduzir o valor da indenização, fixado em R$ 80 mil a cada uma das pessoas trocadas na instituição hospitalar, com majoração dos honorários advocatícios de 10% para 15% sobre o valor da condenação. Os demais integrantes da câmara julgadora seguiram de modo unânime o voto do relator.